Nas duas últimas semanas eu publiquei alguns, digamos assim, poemas que obedecem a algumas regras no estilo das criadas pelo grupo OuLiPo (de OUvroir de LIttérature POtentielle), grupo formado na França em 1960 (excelente ano! uma safra divina!). Em algum outro momento eu falo um pouco mais desse grupo, mas o que queria fazer agora é explicar a regra que utilizei na construção das seis recreações publicadas.
Essa regra, veremos que é bem simples, foi primeiramente
utilizada por Carl Andre em seu poema “On the Sadness”. Carl era um artista
plástico minimalista e seu poema apareceu originalmente em uma exposição de
arte em 1978. Para explicar, vamos tomar como exemplo a recreação Retrês, numerando as suas
linhas a partir do número 2:
2 recuperar
3 recusar
4 = 2x2 = 22 recuperar,
sim
recuperar
5 retomar
o repertório
6 = 2x3 recuperar
e recusar
7 recusar
e retomar
8 = 2x2x2 = 23 recuperar,
sim
recusar
9 = 3x3 = 32 recusar, sim recuperar
10 = 2x5 recuperar
e retomar o repertório
11 recuperar
e recusar o repertório
Observe que os números
2,3,5,7 e 11 não podem ser escritos como produto de outros números (positivos)
menores sem utilizar o 1 (são portanto chamados de números primos). Por outro
lado, 4 =
2x2 = 22, 6 = 2x3, 8 = 2x2x2 = 23, 9 = 3x3 = 32
e 10 = 2x5 são escritos como produtos dos primos 2,3 e 5. Em cada um dos casos
4, 8 e 9 o mesmo primo aparece mais do que uma vez e só ele aparece e, por isso,
escrevemos tais números como uma exponenciação: 22, 23 e 32,
respectivamente. O que está por trás dessa propriedade de decomposição em
números primos é o chamado “Teorema Fundamental da Aritmética”.
Inicialmente, escolhemos palavras ou expressões para
cada primo 2, 3, 5, 7 e 11. O próximo passo é escolher algo (palavra(s),
pontuação ou até mesmo nada) para a multiplicação e para a exponenciação. Na nossa
recreação acima, escolhemos “e” para a multiplicação e “, sim” para a
exponenciação.
Com essas escolhas, agora, as linhas 4, 6, 8, 9 e 10
ficam determinadas. Por exemplo, 4 = 22 e, por isso, nessa linha,
usamos a palavra “recuperar” (por conta da linha 2), seguida de “, sim” (por
conta da exponenciação) seguida de “recuperar” novamente (também por conta da linha
2). Outro exemplo, na linha 10 aparece “recuperar” seguida de “e”
(correspondente à multiplicação) e seguida de “retomar o repertório” (que
corresponde à linha 5).
Escolhi para as minhas recreações poemas de 10 linhas,
mas, é claro, pode-se aumentar esse número ao bel prazer. Por exemplo, no poema
do Carl Andre há 46 linhas (numeradas do primo 2 ao primo 47). A única
diferença para o poema “On the Sadness” é que, além das escolhas feitas, o autor numerou as linhas de baixo para cima enquanto que eu fiz ao contrário. Sarah
Glaz usou a mesma regra em seu poema “January 2009” com linhas numeradas de 2 a
13, também de cima para baixo.
olá Flávio, realmente interessante e senti falta da minha prancheta grande e um papel de desenho para servir de apoio ao entendimento... Hoje não estou atenta o suficiente para esta sua bem planejada "aula", voltarei com o equipamento organizado.com certeza deixo notícia. Aliás se precisar de matemática só sei o básico MESMO!!!! Boa noite e um bom domingo.
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