Devido
ao indiscutível conhecer jurídico do Thio Therezo, mais que frequentemente ele
é convidado a dar palestras nos mais inesperados lugares. Não que o convite do
Instituto de Doutrinação Política (idepê) de Brasília fosse estranho por conta
do assunto que solicitaram ao Thio, mas sim por conta da óbvia divergência
política que se criou ao longo dos anos entre eles, idepê e Thio.
O Thio
não se incomoda com divergências, nunca se incomodou. Ele é daqueles que
acreditam que é possível sim uma convivência pacífica mesmo nessas
circunstâncias, até mesmo com interlocutores de grupos como, por exemplo, o tal
emebelê (Movimento Bem Legal), e olha que divergências abundam e muito entre
eles.
Além do mais, por sua vez, o
Thio fora muito bem tratado nesse contato inicial do idepê e que culminou com o
convite para uma palestra sobre os princípios
jurídicos vigentes nesses tempos de pós-verdades. Viagem paga, carro
esperando no aeroporto, almoço agendado no principal restaurante da capital para
depois da palestra, um bom cachê.
Mas tão
logo chegou ao idepê, sentiu um clima diferente daquele das trocas de
telefonemas. Gentis que fossem as palavras e as atitudes, o fato de quererem
saber de antemão o que o Thio falaria constrangeu o encontro entre ele e os
diretores do instituto. Mas o Thio, mesmo tímido que é, tirou de letra esse
pequeno contratempo.
O que o
surpreendeu de certa maneira foi saber que, devido a um inesperado pequeno problema técnico, sua palestra não seria
transmitida ao vivo como era o costume para esse tipo de eventos. Mas,
garantiram-lhe, ela seria gravada e disponibilizada depois para quem quisesse assistir.
Se foi resultado do mesmo problema técnico ou de outro talvez, o fato é que tal
palestra nunca apareceu na página do idepê e, inclusive, nem menção a ela pode
ser encontrada lá. Silêncio total...
O Thio
costuma dizer que sua palestra gravada, assim como os anúncios dela e possíveis
repercussões, tinham sido arquivados em uma nuvem e, sabe-se lá, choveu
inesperadamente, trovejou, uma garoa que fosse e tudo se perdeu em algum lugar
misterioso bem longe dali... uma poça cibernética abrigando sua fala e ideias...
Mas,
mesmo sem a transmissão direta, a palestra aconteceu e o Thio falou dos tais
princípios jurídicos para um público restrito e inquieto. Listou-os em três
categorias:
(i)
princípios
gerais: da impessoalidade; da razoabilidade; da inocência presumida...
(ii)
princípios
específicos: da convicção, da desnecessidade de provas,
da teoria do domínio do desejo...
(iii)
princípio
supremo.
Tudo ia bem até ele chegar
ao enunciado do princípio supremo, o que deve se sobrepor a todos os outros, sem
exceção, sem contestação, o que é supremo, supremo deve ser considerado,
supremo é!
Quando o Thio, depois de um
pigarreio, enunciou o supremo princípio ao cada vez mais restrito grupo de ouvintes,
a luz do auditório falhou, devido talvez ao mesmo inesperado problema técnico
de antes, a câmera deixou de funcionar, e tudo teve que ser suspenso. Até um
discreto alerta de incêndio foi posteriormente reportado à imprensa.
Nem
precisa ser dito que o almoço com a diretoria do idepê foi silencioso. Não por
conta do Thio que contou inúmeras de suas estórias enquanto saboreava um bom
vinho e degustava o que os gregos antigos chamavam de boa convivência . Como se
apreciar a vida e a companhia de pessoas interessantes, mesmo que com ideias
discordantes, fosse um grande sacrifício, os diretores do idepê presentes não
viam a hora de despachar o Thio de volta a São Paulo.
Quando o
Thio chegou em casa, todos estávamos curiosos para saber o que se passara. Ele
sorriu, tirou do bolso a folha em que anotara o princípio supremo, amassou-a e
lá se foi ao lixo o único indício de que alguma vez houvera uma palestra do
Thio no idepê (além das poças cibernéticas que provavelmente ainda resistem da
chuva que caiu sei lá onde...).
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