- Pai, por que você é avô?
Os olhos amendoados daquele tiquinho de pessoa me pegaram de surpresa, seu sorriso, que merda! Olhos e sorrisos me lembravam constantemente da mãe, vontade de chorar de saudades, de desespero, de impotência... mas é hora de me recompor, isso sim, de sorrir de volta e sutilmente desviar o assunto.
Não tenho problema em parecer mais o seu avô que seu pai (a merda é parecer quase um bisavô...), mas essa pergunta, sei, levará a outra e a outra mais e chegaremos à mãe, essa sim mãe, e não avó.
Como dizer àquele tiquinho de gente, cabelos encaracolados, lábios grossos como os dela (e que saudades!) e olhar profundo, como falar o que realmente aconteceu à sua mãe? Falar de minha incompetência em lidar com sua depressão?
- Pai, por que você é avô?
- Não sou, sou o lobo que vai devorar a minha titikinha... – e me jogo em cima dela fazendo cócegas. Ela nem percebeu minha lágrima furtiva, tão compenetrada estava em gargalhar e sair correndo para o seu quarto deixando-me desconsolado no chão da sala...
Levantei-me, merda de juntas que resolvem doer nessas horas... enxuguei minha lágrima, olhei a janela por onde ela pulou...
[[Em 2019, além de ter publicado "outros tantos" pela PENALUX, também publiquei um pequeno livreto chamado "as nuvens amortecem a queda" pela Sangre Editorial dentro da coleção 32. Feita artesanalmente em Buenos Aires e com 32 folhas apenas, esse livreto é bem especial, ainda mais que contém alguns contos que me agradam muito. Estou publicando aqui o seu conteúdo: cinco contos (ou assim eu os vejo) e seis aldravias (que publicarei todas juntas ao final). O dessa semana é o terceiro conto. Espero que gostem.]]
[[Outra coisa. No dia 9 de agosto último, eu fui entrevistado por Adriana Mayrinck dentro do projeto Toca a Falar Disso coordenado por ela e pelo Emanuel Lomelino (ambos da In-Finita). A entrevista agora está disponível no YouTube, basta clicar aqui.]]
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