quinta-feira, 29 de abril de 2021

Noves Fora...

 

          Às vezes, uns gritos, gemidos em meio a um incômodo silêncio, me acordam no meio da noite. O suor frio me imobiliza, me prende à cama. Quando consigo, levanto-me, vou ao banheiro da suíte de casa, subo na banheira para ter uma boa visão da rua pela janela alta. Mas nada! Ouço gritos de desespero, angustiantes gemidos, mas nada vejo, e, no entanto, parece a voz de meu irmão.

          Não há nada pior do que gritos de desespero no meio da noite, nada pior do que isso na escuridão do medo. Pareço impotente, estou impotente, sou impotente nesses momentos. Suo, ouço, assusto-me, amedronto-me, estou preso à cama, sinto meu peito arder ao escutar esses gritos todos vindo da rua. São do meu irmão? Não sei, parecem ser, temo que sejam.

          Arrisco olhar e ele não está na cama ao lado. Ainda ouço os gritos que me acompanharão pelo resto da vida, noites insones me atemorizarão até o fim. Custo a dormir novamente, mesmo com o inquieto silêncio que agora volta a reinar, só dormirei mesmo quando o coração voltar ao normal. Quando acordo, finalmente, vejo que ele está bem, dormindo, ressonando tranquilamente na cama ao lado, mas a experiência, essa noite desesperadora, me acompanhará ao longo de vários dias ainda, o temor e a angústia presentes em meu cotidiano.

          De resto, tenho uma boa vida, nada para reclamar...

Bogotá, março de 2012


[[Este conto apareceu inicialmente no livro Contos&Vinténs (Editora A Girafa, 2012).]]

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