[[[continuação da semana passada]]]
Se por
consequência de nossa conversa do dia anterior ou por conta de qualquer outra
razão, decifrável ou não, o fato é que o Thio Therezo me acordou cedo naquela
quinta-feira tentando me convencer a acompanhá-lo à exposição da Yoko no Tomie,
a mesma que eu já tinha ido na véspera e da qual tanto conversamos a respeito.
Eu ainda
tentava manter os olhos abertos quando ele falou:
“Mas tem
uma condição, garoto, tanto eu quanto você vamos participar ativamente de uma
das instruções da Yoko!” Nada mais desencorajador a alguém como eu que isso:
participar de alguma performance de arte, em museu, na rua ou em um teatro que
seja. Ainda mais se esse alguém está com o sono atrasado. Só tive tempo de
insistir em meu caráter contemplativo antes de me virar e tantar retomar meu
justo descanso.
“... que
contemplativo que nada! Você é preguiçoso, isso sim...” e completou “... vamos
lá, garoto, vai ser divertido!”
Isso
sim, se há uma palavra pra descrever essa minha convivência com o Thio é essa.
Divertido!
Desisti
de resistir e lá fomos nós.
Como eu
já tinha visitado a exposição, comecei a explicar as obras ao Thio, que me
olhava com condescendência e ironia.
“Que?”
perguntei.
“Nada,
nada... tá bom, garoto... saiba que eu conheço todas essas instruções da Yoko
de cor e salteado... não te contei?”
Engoli
em seco, sim ele tinha me contado com detalhes que poucos conheciam. O Thio
então me cobrou a promessa de participar de alguma instrução da Yoko, ele parecia
ansioso além da conta.
Suspirei
sem esperança de escapar desse encargo, pois seguramente era mais fácil
participar de alguma instrução, o mais discreto possível, e se livrar disso que
tentar argumentar com ele. Uma rápida olhada nas opções viáveis e escolhi
pregar um prego na madeira que ficava na parede quase que na entrada da sala.
Ajustei
o prego, bati o martelo com toda a minha convicção e talvez o impacto tenha
sido muito convincente para um tímido como eu e, pago o meu mico, dois outros
pregos se soltam da instalação e caem ao chão, chamando a atenção de todos os
presentes. Como são barulhentos esses tais pregos de exposições conceituais!
O Thio
riu e só disse:
“... e
lá se vão os sonhos de duas pessoas... tsk tsk tsk... sobrinho destruidor de
sonhos...”. Seus comentários e risos não me ajudaram em nada naquele momento.
Desisti de pregar o meu na madeira e lá fui me afastando, fingindo uma
naturalidade que dificilmente convenceu alguém naquele recinto. Tive até a
impressão que um dos guardas da exposição me examinava com um justo olhar de
reprimenda.
“Ah! O
telefone da Yoko!” Pronto, o Thio tinha achado o telefone. Foi só então que eu
percebi que ele me forçara a participar de alguma instrução só para ter ele próprio um álibi para também participar
de alguma outra. Paciência, o Thio e suas manias!
O
telefone... sim, percebia agora, era por isso que ele estava aqui!
Ele foi
até o aparelho. Retirou o fone do gancho aproveitando a distração dos
guardinhas do museu. Discou um número. Se só há uma pessoa que conhece o número
daquele telefone da exposição, é igualmente verdade que há poucas pessoas que
sabem o número do telefone pessoal da Yoko.
E o
Thio, um deles.
“Hi,...
Yoko?... yes, it’s me, Thio Therezo...” o Thio até caprichou no sotaque
americano prá dizer o seu nome. Mas logo, todos os presentes começaram a se
agrupar em torno do Thio que agora falava em uma linguagem estranha a nós.
Horas
depois, o Thio nos contou que falava com a Yoko em um dialeto oriental que
poucas pessoas no mundo conhecem, era a maneira que eles encontraram para fugir
dos curiosos de sempre que sempre os rodeiam. Ele comentou com ela sobre a
montagem da exposição que lhe pareceu razoavelmente fiel com o que ela tinha
dito a ele anos atrás. Só que...
É...
tinha um porém que, nessa posterior conversa comigo, o Thio revelou. Não gostou
da escolha das pedras da instalação que está logo na entrada. Não combinavam, a
seu ver, com momentos tristes ou mesmo com momentos alegres, estavam por demais
polidas, por demais perfeitas, e ele até brincou com a Yoko que deveria ter um
exército de ajudantes no museu prá, toda noite, lustrarem as pedras e apagarem
as marcas digitais decorrentes de tanos maus e bons momentos vividos que essas
deveriam simbolizar.
Paciência,
parece que foi o que a Yoko disse ao Thio...
Paciência,
parece que foi o que o Thio respondeu à Yoko...
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