- Sabe,
Thio, acontece que justamente no dia dessa palestra sobre desejos quânticos eu
tinha uma aula na faculdade.
- A da
esquina?
- Pô, Thio,
fala assim não, que você sabe que ela é conceituada.
- Que seja.
Continua...
- Então, era
uma aula sobre Provas, eu a perdi e desde então não consigo entender
direito esse conceito. O que são Provas afinal? O que eu posso aceitar
como Prova em um processo judicial? Como se prova uma culpa? Daí aparece
uma tal de Produção de Provas. Quer dizer que eu posso produzir eu mesmo
uma prova? Fico confuso, tantos detalhes...
O Thio
olhava estupefato ao juiz. Então era isso? O seu amigo juiz tinha dificuldades
em entender o que era uma prova jurídica. É claro que o Thio já tinha
desconfiado disso em vista das famosas decisões tomadas pelo fake hair ao
longo dos anos. Estava claro que ele sequer desconfiasse o que isso fosse. Mas
como explicar o que é uma prova a alguém que tem tanta dificuldade assim? O
Thio ruminava seus pensamentos tentando achar um meio.
- Veja, como
posso explicar isso a você? Ah, quem sabe você não poderia me dar algum exemplo
concreto e aí discutimos em cima dele.
- Não sei se
devo, são casos sigilosos. Se bem que de vez em quando vazamos coisas pra
imprensa ajudar a gente...
- Fale como
se fosse em teoria... não precisa mencionar nomes...
- Tá. Tem um
caso em que o acusador, grande chapa meu, a gente combina tudo para não dar
xabú depois... pois bem, o acusador quer provar que um determinado sujeito tem um
quadriplex em uma cidade litorânea e quer trazer como prova um recibo de
pedágio da Rodovia Imigrantes na direção ao litoral. É claro que tal recibo
existe, ele foi encontrado em uma diligência ile..., digo legal, feita na casa
de um amigo do acusado.
- Um recibo
de pedágio para comprovar que alguém possui um quadriplex? É isso? Você quer
aceitar isso como prova?
- Não sei se
é uma prova forte... me ajuda, Thio! Mas veja o raciocínio. Se o acusado tem um
recibo de pedágio para ir ao litoral, é claro que ele tem uma razão para ir a uma
das inúmeras cidades litorâneas e essa razão não pode ser outra que ir para o
seu quadriplex conseguido com dinheiro de suborno... não é claro isso?
- Um recibo
de pedágio para comprovar que alguém possui um quadriplex? - O Thio não
acreditava no que ouvia.
- É...
parece fraca... quem sabe se fosse um triplex?
O olhar do
Thio ainda estava perplexo com tudo aquilo, tão perplexo que até o fakinho percebeu.
- Duplex,
talvez? Não, deixemos triplex, é mais chique... o que você acha?
- E não há
nenhuma outra possível prova para tal?
- Há um
depoimento...
- Pode
ser...
- ... de um
vendedor de amendoim da praia que garante que viu o acusado por lá.
- Viu ele
entrar no prédio? Mesmo assim...
- Não, ele o
viu por lá, na praia... ou ao menos era alguém muito parecido com o acusado.
- Ah!
- E tem também o documento.
- E tem também o documento.
- Documento?
- É, o
documento de compra e venda do quadriplex, digamos que seja do triplex.
- Estamos
melhorando.
- Pena que
não esteja assinado...
- Como
assim, não está assinado? Por ninguém?
- É, sem
assinaturas, nenhuma. Na realidade, ninguém sabe de onde veio esse documento,
mas é um documento de compra e venda, né? Me ajuda, Thio, estou com tantas
dificuldades com essas questões de provas... Por que é tão difícil assim?
O Thio ficou
com pena.
- Se você
ainda não tivesse perdido a aula por conta da Isildinha, né?
- É isso,
Thio, agora você percebeu, a culpa é dela! – o fake hair estava
desolado. Mas o Thio sabia que ensinar o que é uma prova judicial a alguém que
detém o poder como os fakinhos desse país tem é por demais da conta. Em
todo o caso, estava tranquilo, pois daqui a pouco, depois da terceira cerveja eles
estariam falando de coisas mais amenas.
- E a
propósito, como ela vai? Ainda a vê? – O Thio provocou.
- A
Isildinha?
- É, ela
mesma.
- Não a vejo mais, não, faz tempo. Brigamos, ela
se decepcionou comigo pois eu não consegui passar no exame da OAB...
- Acontece,
isso acontece. Um brinde, então, às injustiças da vida!
- Um brinde!
– o fake hair levantou seu copo sem perceber a ironia.
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